Por Gutembergue de O. Sapucaia Junior
Esse artigo irá discorrer sobre algumas questões lançadas sobre a temática da propriedade imobiliaria, mas não ache que a posse do imóvel é algo desprezivel ou que não tem valor, ao contrário a posse pode inclusive fazer surgir a propriedade originária via ação de usucapião ( prescrição aquisitiva).
Surge então a dúvida o que é propriedade, a lei responde no artigo 1.228, CC :
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
§ 1 o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
Se a propriedade é isso, o que seria a posse, embora seja mais complexa, o instituto da posse é definido pelo código civil da seguinte maneira:
Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.
Diferente da propriedade que surge com o registro no caso de alienação inter vivos ( exemplo: venda ou doação), isto é, excluida a aquisição de propriedade de forma originária e as hipoteses de sucessão "causa mortis" ( inventário), a posse surge com o exercicio, afinal é um fato:
Art. 1.204. Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.
Sobre esses poderes podemos dizer que usar é conferir destinação para coisa (moradia por exemplo), gozar: significa colher os frutos (alugueis por exemplo), por outro lado, o ato de dispor, seria a venda ou doação (mais comuns) no caso da propriedade, sendo posse a disposição é configurada pela cessão dos direitos possessórios. Quanto ao poder de reaver tão somente é facultado ao proprietário via ação reinvidicatória que é petitória, isto é , fundada na propriedade, o possuidor por outro lado poderia valer-se da ação de reeintegração de posse com o objetivo de reaver a coisa perdida, mas os elementos das ações petitórias e possessórias são diversos, somente o advogado poderá analisar seu caso e optar pela via adequada.
Perguntas sobre a propriedade de bens imóveis não são poucas e muito menos simples, mas neste artigo buscaresmos responder algumas dúvidas, não é nosso objetivo e nem seria possivel esgotar um tema tão complexo em poucas linhas, questões especificas e dúvidas reais deverão ser objeto de consulta com um advogado que fará uma devida analise dos documentos e da sua situação juridica concreta.
Infelizmente por desconhecimento, falta de instrução ou outras razões a todo momento pessoas entram em negócios imobiliários de alto risco, acreditando estarem dentro de uma situação de "segurança juridica" por terem um "contrato" de compra e venda ou recibo de pagamento, mas por vezes não passa de um ledo engano.
Ocorre que para nosso sistema juridico, proprietário é quem registra, isso nos termos do artigo 1.245 do código civil :
Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.
§ 1 o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.
Fica claro que entre vivos a propriedade é adquirida com o registro do título que geralmente é a " escritura de compra e venda", isto por foça do art. 108 do CC:
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Dessa forma tão somente nos casos que envolva legislação específica como por exemplo a alienação fiduciária ou contratos firmados pela Caixa Economica Federal nos programas de habitação nacional que a escritura é dispensável, pois esses instrumentos particulares terão força de escritura pública por previsão legal.
Em breve publicaremos um artigo discorrendo sobre a alienação fiduciaria em garantia de bens imóveis e o novo entedimento do STJ sobre o tema.
"- Então Dr. eu comprei minha terrinha, meu apartamento ou minha casa eu não sou dono com apenas o papel do compra e venda ?
- Meus papé não vale nada?"
Calma!
Vamos passo a passo, primeiramente se o imóvel é regular ( tem registro), isto é, tem matricula imobiliária no cartório de imóveis, a forma correta de transferir a propriedade é mediante a escritura pública como dito acima, o contrato particular tem força entre as partes, mas não é oponivel contra terceiros nem tem aptidão de transferir a propriedade nos termos do art. 1.245 CC.
Esse contrato de compra e venda em tese é uma promessa que é aperfeiçoada com lavratura da escritura pública (venda e compra) lavrada no tabelionato de notas, após a escritura deve ser registrado no registro (cartório) de imóveis da região do imóvel (circunscrição) essa norma é cogente, isto é, pelo principio da territorialidade cada região geografica tem um registro de imóveis competente para fins de registro e averbações:
Art. 169. Todos os atos enumerados no art. 167 desta Lei são obrigatórios e serão efetuados na serventia da situação do imóvel, observado o seguinte: [...] (Lei de registros públicos- LRP).
Outro cenário é o imóvel não ser regularizado (sem registro), não existindo a matricula do imóvel, o caminho para regularizar é a via da usucapião, dessa forma para você conseguir passar o imóvel legalmente para seu nome, respeitado os requisitos da prescrição aquisitiva, as modalidades e exigências vão variar conforme o cenário, o advogado é indispensável nesses casos em razão da complexidade e da necessidade de atuação tecnica que observerá as peculiaridades da demanda e as normas públicas atinentes, inclusive do municipio do imóvel.
Lembre-se a lavratura de escritura pública de cessão de direitos possesórios não permite o registro, apesar de ter fé pública do oficial não é tão superior ao contrato particular, isto porque, essa escritura é um titulo não registravel, isso significa que você não conseguirá transferir a propriedade com base nessa escritura de cessão, isso não significa dizer que esse documento não tem valor, afinal será um documento idoneo para instruir em conjunto com outros documentos uma regularização imobiliaria via ação de usucapião.
Mesmo que você não tenha a propriedade, isso não significa que você não tenha direitos relativo ao imóvel, nosso código denomina seu direito de posse, isso mesmo, você tem relação de posse com o imóvel, dessa forma, via de regra o "compra e venda" muito usual no Brasil tem natureza juridica de "cessão de posse", isto é, o imóvel transferido não era registrado ou foi passado por quem não tem a propriedade registral, diferentemente do que muita gente imagina, a usucapião não tem o objetivo de tirar nada de ninguém, nosso ordenamento tem como premissa a vedação do enriquecimento sem causa e da boa- fé, por outro lado a propriedade tem função social, assim a inercia do proprietário, o decurso do tempo e o exercicio da posse cumulado com os requisitos da lei configuram a chamada "prescrição aquistiva".
O advogado é indispensável para analisar sua situação, em algumas hipoteses será necessário manejar uma adjudicação compulsória, em caso de negativa de transferencia pelo alienante (vendedor), desde que a compra e venda seja irretratavel e irrevogavel e exista prova da quitação.
Outro cenário é quando o imóvel é transferido por herdeiros sem o inventário, nesses casos a situação torna-se mais complexa e somente a analise do caso fornecerá os elementos necessários para o advogado adotar o caminho mais adequado para regularizar a propriedade.
O outra situação comum é o famoso "contrato de gaveta", isto é, o alienante tem uma financiamento ou outra relação com terceiro e vende o imóvel para outra pessoa, na verdade a natureza desse contrato é "cessão de direitos" de posse ou aquisição, nesses casos a complexidade é ainda maior, pois geralmente o contrato originário registrado no Registro de imóveis veda a transferência sem anuência da instituição, a gama de situações é imensa, a consulta ao advogado se faz necessária para enquadrar sua situação nos requisitos da lei.
Mas Dr, esse processo de regularização é caro, tem muito custo, isso é uma meia verdade, por que o imóvel irregular tem um preço de mercado reduzido, isto é, será comercializado até 50 % mais barato do que um imóvel registrado (no popular "escriturado"), assim ao constar seu nome no registro do imóvel poderá negociar com o Banco, vender com um valor de mercado valorizado, risco menor de ações possessórias e reivindicatórias sobre o imóvel.
Guarde todos os documentos de aquisição do seu imóvel, qualquer papel referente ao imóvel, tenha contas de agua e energia em seu nome, pague IPTU, isto será importante para comprovação do seu tempo de posse para futura ação de usucapião para regularizar sua posse, caso tenha dúvidas da situação juridica do seu imóvel procure um advogado.
Para finalizar, em caso de aquisição imobiliaria seja de imóveis regularizados ou não, faça uma consulta com advogado, iremos utilizar da "due diligência", uma espécie de procedimento "similar" a uma vistoria cautelar para compra de carros (exceto questões atinentes a engenharia), nossa equipe irá fazer buscas de ações em nome do vendedor, iremos analisar a situação formal do imóvel e orientar o cliente sobre os cuidados que deverão adotar, com um indicativo positivo ou negativo para compra com a devida fundamentação, obviamente o cliente poderá continuar com o negócio desde que considere os riscos envolvidos aceitáveis, nossa avaliação será exclusivamente juridica, questões que envolvam normas de construção ou condições fisicas do imóvel deverão ser objeto de laudo de engenharia.
Assim nesse artigo vimos que a escritura é diferente do registro (matricula), se tão somente lavrar a escritura e não registrar o alienante (vendedor) ainda continua sendo havido como dono, nos termos do § 1º do art. 1.245 da lei civil.
Independemente de você ter relação de posse ou propriedade com o aludido imóvel, o ordenamento juridico confere o uso ações possessórias que poderão ser utilizadas para proteção de sua relação com o imovel frente a terceiros (interdito proibitório, manutenção e reintegração de posse), a imissão na posse é ação petitoria, isto é somente o proprietário pode utilizar, assim ao regularizar o imóvel se adquire plenamente a propriedade e confere-se uma maior segurança juridica.
Sobre esses institutos possessórios iremos públicar ainda esse ano um artigo explicando sobre cada um deles.
Dessa forma um imóvel adquirido tão somente pela posse tem mais riscos de litigio, isto é, terceiros podem querer reeinvidicar o bem, alegando ser proprietário ou até mesmo possuidor da coisa, nestas situações se faz necessário a proteção da posse, mas as dificuldades são maiores, justamente pelo risco envolvido nessas aquisições, não por outra razão o valor de mercado é bem menor do que imóveis registrados como já dito.
Mas lembre-se nosso ordenamento confere apenas presunção relativa de veracidade dos atos, assim ainda que o imóvel seja registrado pode ser objeto de uma anulatória, obviamente que os requisitos são mais robustos, o objetivo do advogado é lhe proteger de situações de fragilidade juridica e encontrar soluções para efetivação de seus direitos, mas como sempre orienta-se aos clientes a terem provas, assim munidos de embasamento legal em caso de uma briga judicial estarão melhor preprados, a pior coisa é entrar em eventual litigio com poucas provas em um cenário completamente desfavoravel.
Seja qual for a forma de aquisição do seu imóvel, procure um advogado e tire dúvidas e se você tem receios de qualquer ação de terceiros, não deixe para depois, adote um perfil preventivo, nossa equipe especializada ajudará você na produção de provas e a tomar providências que irão reforçar seus direitos relativos ao imóvel ou lhe aconselhar sobre eventuais riscos.
Gutembergue de O. Sapucaia Junior é advogado com MBA em Finanças, Auditoria e Controladoria e Pós graduando em Direito Imobiliário, Sócio-Fundador do escritório Gutembergue Sapucaia & Advogados
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